Saúde: Cartilha de Prevenção ao Suicídio identifica população de risco
Por Pedro Fávaro Jr.
Jundiaí celebra o Setembro Amarelo, Mês Internacional da Prevenção ao Suicídio com a publicação e distribuição da primeira Cartilha de Prevenção ao Suicídio elaborada entre as cidades de seu porte (370 mil habitantes, IBGE 2010), no interior do Estado de São Paulo. O psicólogo Alexandre Moreno Sandri, coordenador de Saúde Mental, Álcool e Outras Drogas do município, conseguiu sistematizar os dados a respeito da chamada “epidemia silenciosa”, depois de quase dois anos de trabalho. Sabe agora que a população de risco maior está entre homens de 20 a 49 anos, moradores de territórios de maior vulnerabilidade psicossocial – os bairros da periferia. “Esses dados epidemiológicos agora sistematizados podem ganhar caráter instrumental na construção de políticas públicas sobre o tema”, argumenta.
Segundo o psicólogo, foram necessários “muitos braços e muita coragem” para chegar a esse resultado. Todo o trabalho se deu a partir de capacitação sobre Detecção, Atenção e Manejo das situações de crise suicida, iniciada no final de 2016, com um grupo de 150 trabalhadores da rede intersetorial e que, em 2017, recebeu o suporte também do Grupo de Trabalho de Prevenção ao Suicídio e de servidores de diferentes pontos de atenção, tais como Saúde Mental, Atenção Básica e Vigilância Epidemiológica.
“Desse modo, pudemos conhecer e caracterizar o sujeito que tenta ou que cometeu suicídio em Jundiaí bem como os territórios onde há maior incidência, como os bairros do Novo Horizonte, São Camilo, Tamoio e outros com características semelhantes. Isto nos permitirá planejar e realizar ações preventivas mais direcionadas a estas condições”, comemora.
Para Sandri, a cartilha permite o acesso à informação sobre o assunto de forma simples e direta, para orientar os profissionais sobre o tema do suicídio e, ao mesmo tempo, fomenta a construção de ações que, a curto e médio prazo, fortaleçam a rede de cuidados para a prevenção e atenção às situações de crise suicida. “Já iniciamos a distribuição, mas, como a tiragem inicial foi pequena, iniciamos com alguns serviços e atores estratégicos e, na sequência, faremos a distribuição mais ampla do material. A cartilha será distribuída para serviços de Saúde, da Assistência e Desenvolvimento Social, escolas, entidades (inclusive as de Segurança Pública) e também já está disponibilizada no portal da prefeitura e aplicativo.
Sandri apresentou a cartilha ainda em fase de elaboração, antes de sua publicação, no 2º Encontro de Valorização da Vida – Suicídio: Epidemia Calada, que reuniu um público de 1200 pessoas para ouvir palestrantes de diversas área de interesse, especializados em lidar com a prevenção ao suicídio, promovido pela Prefeitura do Município de Jundiaí, Rede TV TEC e Centro de Valorização da Vida o seminário foi realizado em 31 de agosto.
TEMA TABU
“O suicídio é uma grave questão de saúde pública que, nos últimos anos, vem ganhando contorno de epidemia. Só pra se ter uma ideia, no mundo, 800 mil pessoas se suicidam todos os anos e o suicídio já é, hoje, a segunda principal causa de morte entre os jovens de 15 a 29 anos. No Brasil, nos últimos 12 anos, houve um aumento de 15,3% no número de suicídios entre jovens”, recorda o psicólogo.
LEIA TAMBÉM:
Saúde: São Paulo é o segundo Estado com mais menções a suicídio nas redes sociais
Apesar disto, é um tema pouco abordado pelos profissionais de saúde e pela sociedade em geral, por ser cercado de tabus, estigmas e preconceitos. “Com o lançamento da cartilha (e com as demais ações que compõem a programação deste mês) desejamos lançar luz sobre esta questão, fixando o tema na pauta do município, buscando levar todos a uma reflexão sobre o assunto”, explica acrescentando que patrocinar a reflexão sobre ele é uma atitude “importante e corajosa, porque valoriza e encara de frente uma questão delicada”.
Sandri está desde 2006 atuando na rede de Saúde Pública de Jundiaí. É graduado em Psicologia na Universidade de São Paulo (USP), com especialização em Psicologia do Desenvolvimento na Unicamp e mestrado em Psicologia Clínica na USP. Concentra maior parte do meu tempo no âmbito da saúde pública e já trabalhou na rede de saúde de São Paulo. “Acredito que o que me fez escolher a profissão foi um profundo interesse pelo ser humano, pelas pessoas e suas histórias. Em toda escolha, há aspectos conscientes e outros nem tanto. Certamente minha história de vida, questões familiares também contribuíram. Na adolescência, também comecei a me interessar por psicanálise, sobretudo pela obra de Freud, o que também me encaminhou para essa escolha”, recorda.
Ele vê como o maior desafio à frente da Coordenação de Saúde Mental de Jundiaí seja prover ações de cuidado e prevenção a um contingente cada vez maior de pessoas com sofrimento psíquico, em meio a uma organização social que define como “cada vez mais adoecedora” em razão das pressões que cria por resultados (performance), pelo individualismo exacerbado, pelo enfraquecimento das relações comunitárias e afetivas, pelo consumo tomado como ideal social máximo (“tenho, logo existo”), pela a violência manifesta em todos os ambientes.
“Tudo isso tem causado enorme impacto na saúde mental das pessoas e, por vezes, temos a tendência a acreditar que a medicalização maciça de todas estas questões seria a melhor resposta. O desafio, então, é construir ações nos diferentes níveis de atenção e de forma intersetorial para que tenhamos ofertas de cuidado fundamentadas na produção de vida! Acho que também é uma grande tarefa contribuir para a desconstrução do estigma e preconceito em torno das questões de saúde mental, especialmente das pessoas com sofrimento psíquico grave. Ainda há muito trabalho pela frente para assegurar sua inclusão social!”, avalia Sandri.